sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Você fala bonito?

Falar sobre beleza é interminável, pois a beleza por ser essencialmente um adjetivo, uma qualidade, pode ser aplicada a tudo o que existe. Resolvi então escrever sobre algo que trabalho como psicólogo e professor: a palavra. Vamos pensar sobre palavras, ou melhor, discursos. O ato de encantar pela fala. O ‘falar bonito’. E aqui já cabe uma pergunta - numa era de tantos discursos, quais seriam aqueles com poder ainda de nos encantar?

No dito popular afirmamos que ‘falar é fácil’. Penso que nenhum psicólogo ache isso. Sabemos muitas vezes como é difícil fazer aquele que foi ali para receber ajuda fazer a coisa mais óbvia: falar. Falar não é fácil, pelo menos se for pra falar daquilo que realmente importa, ou seja, a verdade. Falar talvez seja mais fácil quando se fala sobre aquilo que não se sente. Quando falamos de sentimentos aí percebemos o quanto é difícil falar. Muitas vezes chamamos de discurso ‘bonito’ aquele que sabemos que é irreal, que é utópico. Em outros termos, um discurso vazio, desprovido de autenticidade, de sentimento. Que pecado chamar isso de bonito! O que está implícito aí é que beleza e autenticidade são pares opostos. Nada mais equivocado para os nossos tempos.

Quando nos referimos a discursos vazios a nossa política brasileira seria o alvo predileto. Todos os políticos querem falar ‘bonito’ para conseguirem votos. Pois um exemplo de que precisamos rever os nossos conceitos do que é belo está no que aconteceu recentemente na política. Nas últimas eleições o palhaço Tiririca foi um dos candidatos a obter o maior número de votos. Por quê? Votos de protesto, votos de pessoas que queriam fazer graça como ele? Pode ser. Mas tenho uma hipótese também. Penso que as pessoas cansaram dos discursos prontos, inautênticos. Tiririca acertou quando escolheu ir do jeito dele. Acertou, mesmo que não seja o tipo de campanha que esperamos de uma candidatura ‘séria’. Ali estava finalmente um discurso ‘autêntico’, diferente de todos e convenhamos é muito fácil discursar como político. A propaganda do Tiririca pode não ter sido ‘bela’ no sentido tradicional de beleza. Mas ali estava um discurso mais próximo da graça, do sentimento, da provocação, da inteligência, da arte, do real.

Hoje acho bonito mesmo o discurso que leva autenticidade. Quem fala bonito pra mim são aqueles que na sua fala expressam os seus sentimentos. É uma fala visceral, viva. Não são herméticos em seus discursos, mas pessoais, acima de tudo, humanos. Assim posso gostar mais do humano que há em mim. Do que eu tenho hoje e não do que está por vir. Falar assim é bonito, pois se fala não só com a ‘cabeça’, mas com todo o corpo. E este, sensível pela sua própria natureza, sendo escutado, não o sabota em sua fala, mas ao contrário lhe retribui enviando-lhe palavras e vida.